sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Minhas Memórias Literárias

As minhas primeiras experiências com a leitura deram-se quando entrei para o Jardim de Infância numa escolinha encantadora ao lado do antigo Aeroporto de Fortaleza, bem embaixo da estátua do Vaqueiro que dava nome a praça. O lugar era mágico! Lembro-me bem que durante o recreio brincávamos no enorme parque defronte à escola. Mas, não era só isso. Havia a tia Lúcia que sempre após a leitura de algum livrinho deixava-nos brincar de massinha. Eu adorava isso.
Alfabetizei-me cedo através da cartilha “O Sonho de Talita”, menina loirinha que sonhava com as letras e trazia para nós frases do tipo, “O bebê vê a babá”
Infelizmente, não havia por parte de meus pais incentivo à prática de leitura. Cobravam-me apenas as tarefas escolares e boas notas. Talvez por isso, já em outra escola, na 1ª série, tenha um dia levado para casa, sem a professora ver, um lindo livro colorido e de capa dura com a história de João e o Pé de Feijão que estava junto a tantos outros que líamos durante as aulas. Morri de medo que descobrissem meu “furto”. Li e reli várias vezes a história, embevecida com a leitura e as gravuras. Mas, meu deleite durou pouco, minha mãe ao descobrir o malfeito, fez-me devolvê-lo. Morri de vergonha! Não me lembro de outras leituras significativas nesta fase da minha infância, além de uma, aos 11 anos, quando ganhei o primeiro livro de uma tia freira, ao retornar do Rio de Janeiro, em férias. Era a história da “Anjinha Terezinha” de Ganymédes José. Uma anjinha que recebeu de seus superiores a dura missão de realizar sete grandes obras na terra, transformando a vida das pessoas. O livro chegou a ficar com as folhas soltas de tanto manuseio, pois adorava lê-lo várias vezes.
Lembro-me dos livros da coleção “Para Gostar de Ler” que sempre pedia ao meu tio professor que recebia das editoras e deixava exposto na sua estante. O título e a leitura curta de crônicas e contos me atraiu. Passei a admirar Paulo Mendes Campos, Fernando Sabino, Stanislaw Ponte Preta, Rubem Braga, Carlos Drummond e outros.
Ainda no Ensino Fundamental fui levada a ler várias obras da coleção vaga-lume, sempre durante as férias e para avaliação posterior em uma “ficha de leitura”. Livros bons, como O Caso da Borboleta Atíria, Um Cadáver Ouve Rádio, Menino de Asas e o Rapto do Garoto de Ouro, todavia, passei a lê-los com desgosto, por conta da cobrança.
Hoje vejo que a escola contribuiu muito para não criar em mim o hábito da leitura. Não lembro sequer de ter ido a uma biblioteca nestes anos, acho até que à época nem havia uma em minha escola.
Durante o Ensino Médio li alguns livros indicados para o vestibular, especialmente os clássicos da literatura brasileira de Machado de Assis e José de Alencar. Pelo rigor da cobrança e pela ausência de estímulos de meus professores achava aquilo uma leitura enfadonha e sem graça.
Foi somente na minha graduação, no curso de Letras, que a concepção de leitura mudou em minha vida. Foi através do professor Sânzio de Azevedo, querido mestre e conceituado escritor e crítico cearense que tive o prazer de ler e me encantar com obras de autores cearenses, tais como A Normalista, de Adolfo Caminha; Dona Guidinha do Poço, de Oliveira Paiva, cuja história envolvente denunciava um crime acontecido no interior do Ceará que consternou toda a sociedade cearense da época. Lembro-me de como ele nos encantava ao ler trechos e fazer comentários sobre as obras. Passava-nos um prazer tão grande pela leitura, que mesmo numa situação de leitura acadêmica, me sentia motivada a ler mais.
Passaram por mim outros professores que me encantaram com a literatura portuguesa de Camões e os heterônimos de Fernando Pessoa. Ao mesmo tempo, durante esse período acadêmico li algumas obras de Sidney Sheldon, obras consideradas sub-literaturas por meus queridos professores. Adorava as histórias envolventes e misteriosas.
Na pós-graduação tive o prazer de ter como professora Vicência Jaguaribe, mestra experiente que fascinava a todos com sua “bolsa mágica”, sim, mágica para nós alunos, pois ao mesmo tempo em que estudávamos um texto acadêmico, de sua bolsa saltava uma obra da Literatura infantil e infanto-juvenil que nos encantava através de sua leitura envolvente, fazendo-nos enxergar detalhes que enchiam a obra de encanto e beleza. Pensava comigo: como gostaria de encantar meus alunos assim...
Tornei-me professora muito cedo. E hoje vejo que a responsabilidade com o trabalho muito precoce tirou de mim o tempo suficiente para me deixar levar pela leitura por fruição de bons livros. O ativismo e a necessidade de formação constante levaram-me a ler muitos livros técnicos da minha área de atuação, especialmente depois de assumir o cargo de técnica da Secretaria. A última leitura que fiz por prazer foi O Silêncio dos Amantes de Lya Luft.
Sou consciente que, para despertar o gosto pela leitura de meus professores cursistas e de meus alunos, preciso ler mais, e, principalmente, procurar transmitir a mesma magia que enxergava na bolsa da maravilhosa professora Vicência. Ah! Que belo exemplo!

Ana Leonília Alves de Sousa